É comum à maioria dos médicos ser pressionado por seus pacientes no sentido de emitir atestado médico determinando afastamento do trabalho por tempo superior a real necessidade da doença existente. E nenhum de nós, médicos, pode deixar de admitir que contrariar um paciente pode ser um grande passo no sentido de perdê-lo como cliente. Negar um atestado “gracioso” também representa o risco potencial de comprar uma inimizade com o paciente, o que não raro irá resultar em propaganda negativa a ser divulgada pelo mesmo, frustado por não ter atingido seus objetivos. Como se isso não bastasse, sabe-se que grande parte destes pacientes não se importará em pagar consulta com outro colega já que este dará ao cliente o atestado que ele pleiteava.
Nós, médicos, estamos merecendo o péssimo conceito profissional do qual estamos desfrutando, pois temos priorizado a comodidade do clientelismo e da política da boa vizinhança irresponsável em detrimento da conduta ética e estritamente profissional. Atestados de doença irregularmente emitidos e atestados de saúde ocupacional expedidos sem que o paciente sequer tenha sido examinado são práticas cada vez mais comuns no meio médico, que maculam a honra de toda uma categoria profissional. O descrédito de nossa profissão e o rótulo de “máfia de branco” ou “dinheiristas” é resultado dessa política imediatista, individualista e irresponsável que é dificílima de combater pelo espírito corporativista e comodista de grande parte dos médicos.
É hora de refletir sobre os destinos da nossa profissão e de como recuperar a confiança de uma população que hoje “compra” atestados por conta de um sorriso, um cruzar de pernas ou qualquer meia dúzia de reais. Faz-se necessário questionar o rumo de uma credibilidade histórica seriamente abalada por nossos atos ou omissões. Se a política de saúde pública brasileira não nos oferece as condições mínimas ao exercício de nossa profissão, pelo menos ajamos com honestidade e critério ético. Não se deve esquecer que o paciente que hoje se mostra satisfeito em obter um atestado fraudulento será também aquele que vai processar o médico na primeira oportunidade, pois ele aprendeu na prática que para muitos colegas a medicina e a ética estão irremediavelmente divorciadas.